top of page

Torpor (Paula Borghi)
 

Em 1960 se inaugurava (ainda que incompleta) a capital Brasília que, passado meio século, segue como uma das principais referências arquitetônicas do período. Localizada na região central do país, a cidade marca o modernismo brasileiro por sua célebre forma de avião. Construção de espaço e de pensamento arquitetônico que é constantemente referenciada, nacional e internacionalmente, dado que a cultura contemporânea ainda segue sob influência direta das heranças modernistas.
Influência que se faz viva e presente na série de desenhos Torpor de Henrique de França, com imagens que nos fazem lembrar as primeiras fotografias em preto e branco de Brasília. Palavreando o artista, “uma narrativa evasiva e nostálgica que dialoga com os limites entre a cidade e o campo num contexto de um Brasil do presente com marcas de um passado recente.”. É por esta perspectiva, de olhar para trás e enxergar o presente, que voltamos aos anos sessenta, com a clareza dos espaços em branco e as sombras deixadas pelo tempo.
É ao encontro deste contraste entre construção e ausência que os personagens de França planam no branco do papel, encarando uma perspectiva linear e ao mesmo tempo cíclica, como se estivessem presas no mito de Sísifo. São figuras que, assim como seu autor, sabem do retrocesso que lhes esperam, pois ambos têm a consciência da recente história do Brasil. São seres entorpecidos, que sofrem de uma obnubilação dos ideais e que, desiludidos, aguardam a chegada do futuro.
Há uma melancolia, uma tristeza. Torpor nos lembra que, por mais que subamos uma escada, nunca alcançaremos o céu. França nos apresenta desenhos realistas, tanto no gesto do grafite que se assemelha a uma imagem fotográfica, quanto no assunto que esta aborda. É da realidade cotidiana que saem os personagens, a natureza, os objetos, a arquitetura e as situações desenhadas. São imagens fragmentadas, recortes de jornais e revistas, que são combinadas em uma nova e, ao mesmo tempo, velha narrativa. Uma narrativa emboscada no tempo.
Trata-se de um momento de espera, onde a sutileza do traço em cruzar o horizonte do papel pode ser lida como um sinal de esperança. Talvez estas imagens queiram nos lembrar que é preciso movermos para além dos anos sombrios que começaram em sessenta, apagar o incêndio e seguir adiante. Pois, mesmo em Torpor, existe um horizonte.

 

  • (english version)

    The year of 1960 saw the inauguration (although incomplete) of Brazil’s capital, Brasilia, which, half a century past, remains as one of the main architectonic references of that period. Located in the country’s central region, the city marks the brazilian Modernism due to its airplane renowned shape. A construction of space and architecture thinking that is constantly referenced, national and internationaly, given that contemporary culture is still under direct influence of such modernist heritage.
    Such influence is made vividly present in Henrique de França’s Torpor drawing series, which depicts images that brings to mind the first black and white Brasilia’s photographs. Paraphrasing the artist, “an evasive and nostalgic narrative that dialogues with the limits between urban and rural in Brazil’s present context with traces of a recente past”. It is under such perspective, which is, looking back to the past in order to see the present, that we get back to the 60’s, with the clarity of white spaces and shadows left by time.
    To this contrasting encounter between construction and absence, França’s characters float over the blank of the paper, facing a linear and, at the same time, cyclic perspective, as if tied in the Sisyphus myth. These are figures that, just as the author, know about the political setback that awaits them, for both have the conscience of Brazil's recent history. They are torpid beings, that suffer from an obnubilation of their ideals; hence, disillusioned, just wait for the future to come.
    There’s a melancholy, a sadness. Torpor reminds us that, as much as we climb up a stair, we will never reach heaven.
    França presents us realistic drawings, not only due to the graphite gesture that resembles a photographic image, but also to his approach towards the subject. It is from the daily reality that the characters come to life; the nature, the objects, the architecture and situations depicted. These are fragmented images, snips extracted from newspapers and magazines, combined into a new and, simultaneously, old narrative. A narrative ambushed in time.
    It is about a waiting moment, in which the subtlelty of the crossing line that spans the paper’s horizontality can be read as a sign of hope. Maybe these images aim to remind us that we need to walk beyond the dark years that started in the 60’s, put out the fire and move on. For, even in Torpor, there is a horizon.

bottom of page